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Tá confuso? Veja um resumo de direitos que você pode perder em breve

4 de maio de 2017

Fonte: Blog do Sakamoto

São tantas as mudanças propostas pelo governo federal e pelo Congresso Nacional através de reformas que fica difícil saber  se há um direito em risco de desaparecer hoje. Até os textos que são resumos sobre as reformas precisam de resumos, de tanta informação e detalhes. Para ajudar aos leitores a acompanharem o que está acontecendo, este blog escolheu seis mudanças em curso no Congresso Nacional e qual seu ponto principal.

Previdência Social

Apesar das pequenas concessões feitas até agora, o governo federal segue irredutível quanto ao núcleo duro da Reforma da Previdência, que também provoca o maior impacto negativo: estabelecer em 25 anos (ou 300 pagamentos mensais) o tempo mínimo de contribuição para a aposentadoria de trabalhadores assalariados urbanos e rurais. E 15 anos (ou 180 pagamentos mensais) para trabalhadores rurais da economia familiar. Lembrando que, hoje, são necessários 15 anos, não de contribuição, mas de comprovação de atividade ao trabalhador rural – que não tem dinheiro para pagar um carnê todo o mês. Além disso, dada à alta taxa de informalidade, cerca de 80% do total dos trabalhadores já não conseguem contribuir por um quarto de século e, em média, contribuem nove meses a cada 12. Ou seja, muitos serão os que não se aposentarão se aprovadas as novas idades mínimas de 65 e 62 anos, para homens e mulheres respectivamente. Com ”sorte”, acabarão caindo na fila da assistência social para idosos pobres. Enquanto isso, a integralidade da aposentadoria viria com 40 anos de contribuição ininterrupta.

Reforma Trabalhista
Permitir que a negociação entre patrões e empregados fique acima do que diz a lei é o centro da Reforma Trabalhista. Em sindicatos fortes, como alguns de metalúrgicos ou bancários, isso pode render bons frutos. Em sindicatos fracos ou corruptos, negociações tendem a ser desequilibradas a favor dos patrões, aprovando reduções em direitos que coloquem em risco a saúde e a segurança de trabalhadores. A reforma também afasta qualquer responsabilidade de empresas que tenham trabalhadores escravos produzindo exclusivamente para elas, via terceirizadas; limita o valor de indenização a 50 vezes o último salário do trabalhador – ou seja, a morte no serviço de quem ganha um salário mínimo valeria, no máximo, R$ 46.850,00; estabelece contratos intermitentes, em que o trabalhador pode ser chamado a qualquer hora, não sabendo quanto ganhará no final do mês e de quanto será seu descanso; acaba com a remuneração do tempo de deslocamento do trabalhador quando não há transporte público disponível; entre outras dezenas de mudanças.

Reforma Trabalhista Rural
O projeto tem pontos polêmicos, como a possibilidade de ”remuneração de qualquer espécie”, que – por sua inconstitucionalidade – funcionam como um ”bode na sala”. O centro do interesses dos proprietários rurais é outro: o afrouxamento da atual Norma Regulamentadora 31, que trata da fiscalização das condições de saúde e segurança do trabalho no campo, reduzindo a possibilidade de punição de empregadores. O projeto cria, em seu artigo 29, uma ”segunda chance”: em caso da fiscalização encontrar problemas trabalhistas, terá que apenas notificar e agendar outra. Também propõe a prorrogação da jornada diária de trabalho por até quatro horas ante ”necessidade imperiosa ou em face de motivo de força”; reduz o período de trabalho noturno (em que se paga adicional); abre a possibilidade de venda integral de férias aos residentes no local de trabalho e a ”postergar” os finais de semana; exclui a necessidade de providenciar banheiro, água potável e local de descanso para frentes de trabalho com menos de 20 pessoas ou em locais de ”difícil acesso”, entre outras propostas.

Terceirização ampla
Aprovada pelo Congresso e sancionada pela Presidência, a lei é uma antiga reivindicação de empresários para reduzir custos e permite a terceirização de todas as atividades de uma empresa. Se por um lado, pode significar mais dinamismo no mercado de trabalho, por outro tende a rebaixar salários médios. Estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) apontou que, em média um trabalhador terceirizado trabalha três horas a mais por semana e ganha 27% menos que um empregado direto. Especialistas ouvidos pelo blog afirmam também que ela pode facilitar a contratação de pessoas que deveriam ter vínculo empregatício, mas recebem salário através de empresas individuais (as chamadas ”PJs”). Quando a contratação da pessoa jurídica para a atividade-fim era proibida, o empregador tinha que provar que não havia vínculo diante das evidências. A partir de agora, há uma presunção de licitude tanto na constituição da pessoa jurídica quanto na celebração do contrato de prestação de serviços em si. Parte dos magistrados deve demandar que os dois lados provem que a relação é fraudulenta ou não, o que dificultará para o lado do trabalhador.

Enfraquecimento do combate à escravidão 
Há, pelo menos, três propostas semelhantes tramitando no Congresso Nacional para reduzir o conceito de trabalho escravo. Todos querem retirar condições degradantes e jornada exaustiva do artigo 149 do Código Penal, que conceitua o crime. Hoje, são quatro elementos que podem definir escravidão no Brasil: trabalho forçado, servidão por dívida, condições degradantes (abaixo da linha de dignidade, que põem em risco a saúde, a segurança e a vida do trabalhador) e jornada exaustiva (levar ao trabalhador ao completo esgotamento dado à intensidade da exploração, também colocando em risco sua saúde, segurança vida). A bancada ruralista no Congresso Nacional afirma ser difícil conceituar o que sejam esses dois últimos elementos, o que produziria ”insegurança jurídica”. Ao invés de propor uma lei para deixar mais claro os elementos, querem que eles sejam retirados. Dessa forma, as condições em que se encontram os trabalhadores, por mais indignas que sejam, não importariam para a definição de escravidão contemporânea – que se reduziria a uma questão de cárcere privado. O equivalente a punir um homicídio, mas apenas se ele foi cometido por facas e punhais. Isso atenderia aos interesses principalmente de parte dos empregadores do setor agropecuário e extrativista, da construção civil e do vestuário, que vêm sendo flagrados por esse crime desde 1995.

Fiscalização do Ministério do Trabalho resgata trabalhadores em situação análoga à de escravo no Pará (Foto: Leonardo Sakamoto)

Direitos indígenas e de outros povos tradicionais
A questão, óbvia, é a garantia de acesso à terra e a recursos naturais, como madeira, minerais e água, pela agropecuária e pelo extrativismo. Demarcações e titulações de territórios tradicionais têm sido ameaçadas por interferências políticas e interesses econômicos contrários às garantias previstas pela Constituição Federal. Paralelamente, propostas como de emenda constitucional 215/2000 (que transfere a palavra final sobre as demarcações do Poder Executivo para o Congresso Nacional, onde a bancada ruralista tem força) e a possível confirmação da tese jurídica do ”marco temporal” (que estabelece como condição do reconhecimento dos territórios a presença física dos povos na data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988) colocam em risco esses e outros direitos respectivamente no âmbito do Legislativo e do Judiciário. Os indígenas também são afetados pelas outras mudanças listadas neste post. Por suas terras não estarem demarcadas, muitos sobrevivem graças à assistência a idosos pobres (que deve ser afetada pela Reforma da Previdência) e dependem de direitos trabalhistas (o Ministério do Trabalho resgatou do trabalho escravo centenas de indígenas).

Indígenas Gamela, vítimas de ataque no final de abril, em área reivindicada por eles contígua à aldeia Cajueiro Piraí. (Foto: Cimi)